sábado, 2 de dezembro de 2017

Uma Relação Complexa (Crônica)

Após o momento de euforia por ter sido aprovado no vestibular em uma instituição pública, chega o momento de sentar com os pais para ajustar todas as pendências de materiais, rotina, transporte e metas para a vida na Universidade. E então, enquanto o primeiro dia de aula se aproximava e a careca pós-trote iria sumindo em meio aos fios de cabelo que cresciam disformemente devido à falta de piedade dos meus amigos em raspar minha cabeça, a questão do transporte ainda era uma incógnita. Iria de ônibus? Iria de carona? Iria de bike? Tudo isso me preocupava, pois embora já utilizasse ônibus nos anos da escola, ainda tinha receios em andar de ônibus ou até mesmo andar na rua, por conta dos traumas de assaltos sofridos. Já havia sido assaltado na rua, já havia estado em um lugar quando ele foi assaltado, agora só faltava ser assaltado no ônibus, “pronto, nesse ano eu não escapo! Vou desenrolar logo o meu celular do ladrão” eu, pensei. 

Em meio a esses pensamentos, a esperança surgiu ao descobrir que havia um Buzufba que passava literalmente na porta de casa, quase um transporte escolar só que de graça e universitário, e ainda por cima não parava em todos os pontos de ônibus, mas somente nos pontos onde se encontram prédios da UFBA, ou seja, diminuiria bastante a possibilidade de ser assaltado no ônibus. Ufa! Driblei o mau agouro do assalto.
Estava bom demais para ser verdade, quando começaram as aulas e eu comecei a utilizar o Buzufba, provei que realmente é seguro, e que, de certa forma, os ônibus estão conservados internamente, porém, os horários de chegadas e partidas eram uma bagunça! Ônibus previsto para 8:20 da manhã, chega em um dia 9:00 e no dia seguinte 8:10 e isso era um atraso imenso na vida de um estudante sem tempo! Nunca poderia ter certeza se os ônibus atrasariam ou chegariam cedo e o intervalo entre eles é de no mínimo 1 hora. Resumo da ópera: terei que pegar ônibus normal e o mau agouro então riu de mim!  Pelo menos, não seriam todos os dias, pois no primeiro horário das rotas os ônibus são pontuais e em alguns dias não tenho necessidade de pegá-lo. Menos mal. Mas, um dia relatando a alguém sobre minha relação de gratidão e revolta com os Buzufba’s, toda inocência fora tirada quando eu disse animado:
- Foi uma bênção de Deus esse buzufba, pago nada e ainda é seguro, pena que tem esses atrasos que me quebram.
E então essa pessoa respondeu rindo
- Paga nada e é seguro? Você tanto paga como não é seguro. Seus pais pagam impostos que possibilitaram a existência do buzufba, e direto acontecem assaltos, principalmente, pela manhã cedo, no horário em que você pega.
Uma vez li alguém dizer em um artigo que o brasileiro é um povo indeciso, pois ao entrar em um ônibus lotado, pega o único lugar sobrando, seja ele qual for e não reclama. Mas, quando pega um ônibus com vários lugares vazios, é um dilema complexo entre qual seria o melhor lugar a se assentar. Seria o meu caso mais um exemplo de indecisão? Deveria estar contente porque em meio a poucas opções ter o buzufba ou deveria estar insatisfeito com um serviço que é do meu direito, porém é mal prestado? O homem deve ser grato por, em dias difíceis, ter ainda coisas razoavelmente boas ou ele deve ser revoltado por aquilo que tem não ser tão bom quanto lhe é de direito?
Então, essa é a minha relação com o Buzufba, uma relação complexa de gratidão e insatisfação.




SAMUEL BARAUNA DE  FIGUEIREDO – Graduando em Letras Vernáculas com um Língua Estrangeira






Um comentário:

  1. Interessantes os questionamentos mais profundos que foram levantados pelos dilemas com as opções de meios de transportes. Gostei também de sua linguagem descontraída.

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